domingo, maio 31

Em terra de cego...


Em matéria de cinema, estou sempre atrasada. Só hoje consegui ver o Ensaio sobre a Cegueira, do premiadíssimo Fernando Meirelles. Elogiado por alguns, detonado por outros, o filme, na minha modesta opinião de espectadora comum, é, ao mesmo tempo, aterrador e tocante. Apostando numa linguagem simples e direta, mantém o ritmo na medida certa e prende a atenção do começo ao fim. Ao propor a discussão de uma temática tão contundente, Meirelles encontra soluções técnicas que aliviam a tensão, sem, contudo, afrouxar o discurso. Não li o texto de Saramago, por isso não posso avaliar se houve no filme um desvio maior do que a licença poética permite. Mas a julgar pelos comentários elogiosos do Nobel português à obra do diretor brasileiro, não houve exageros. Com a bela metáfora da cegueira, Meireles/Saramago expõe as vísceras dos seres ditos humanos, mostrando o nível de degradação a que chegaram (chegamos). Enfim, endosso o comentário feito por uma blogueira que não conheço, Denise, que disse que o filme de Meirelles “nos obriga a parar, fechar os olhos e ver. Recuperar a lucidez, resgatar o afeto”. Adorei o filme e o comentário!

sábado, maio 30

PERDAS E BÔNUS

Dentre as manias que eu tenho/Uma é gostar de você/Mania é coisa que a gente tem/Mas não sabe por que/ Mania de querer bem/Mania de falar mal/Mania de não dormir/Sem antes ler o jornal... e por aí vai. Assim começa o samba-canção Manias, de Flávio Cavalcanti, gravado e regravado com muito sucesso se não me engano lá pelo fim da década de 50. Você tem alguma mania? Claro que sim. Disfarçada ou escancarada, não há quem não tenha a sua. Hoje me dei conta que cultivo uma que não estava ainda na minha lista. Mas é uma maniazinha boa, que não faz mal a ninguém. Folheando um livro ao acaso, encontrei um cartãozinho carinhoso recebido no Natal de 1999. Lá pelas tantas a mensagem dizia: “ter você como amiga é ter vários natais no ano”. Muito lindo, não é? Deu pra perceber qual é a mania de que estou falando? Isso mesmo, é a de guardar cartões, bilhetinhos, postais e coisas do gênero. Manifestações de carinho que alimentam o espírito e nos fazem olhar a vida com mais otimismo. Coleciono essas mensagens assim, sem guardá-las num lugar definido, por isso de vez em quando topo com alguma delas na bagunça organizada do meu escritório. Você nem imagina como é bom recuperar na memória sensorial o momento que gerou aquelas palavras e, mais ainda, a pessoa que as escreveu! Mesmo que o amigo/amiga tenha sumido na poeira das ruas, trazer de volta sua lembrança é uma sensação incrível. Já reparou como nos perdemos de pessoas que amamos assim sem mais nem menos, apenas porque elas mudam de bairro ou cidade, descobrem novos interesses que nos excluem, ou simplesmente se casam, caem na rotina doméstica e sem querer se afastam? Mas não é sobre os que se perdem que quero falar, e sim sobre os que reencontramos. Aconteceu comigo. Mais de uma vez. Aqui mesmo na internet. Tal como o cartãozinho, o postal ou coisa que o valha, receber inesperadamente uma mensagem de um velho conhecido é como encontrar uma nota de cinqüenta esquecida no bolso de um casaco. Foi essa alegria infantil que experimentei semana passada quando vi meu orkut ser invadido por mensagens inesperadas. Escrevi de volta pra me certificar de que não era nenhuma clonagem. Não era. Felizmente, porque veio muita coisa bonita. Como esse poema instigante aí de baixo, que não resisto a repartir com você. Bem-vindo, amigo.

ALENTO*

Aspira este momento
Que te dá novo alento.

Cada dia é uma vida
Inteira, resumida.

Já não têm conta as horas
Tanto a viver demoras,

Tanto, dia após dia,
Tua morte se adia.

Já viveste outras vidas,
E só não te suicidas

Por um banal motivo:
A idéia de estar vivo!

E te curvas atento
Às regras do convento:

Quando tiveres fome
Curva-te à regra: come.

Se tens sono, há uma cama.
Se tens desejo, ama.

Muito mais que prazeres
Tudo aqui são deveres.

Andar, comer, beber,
Amar, tudo é viver;

Até mesmo dormir
É viver sem sentir.

Viver é um ir-se embora
Da vida, hora após hora...

Aspira este momento
Que te dá tanto alento!


*Dante Milano, em "Poesia e Prosa".
Organização de Virgílio Costa.
Coleção "Vária"; Núcleo Editorial da UERJ.
Editora Civilização Brasileira (RJ) - 1979.


domingo, maio 24

E o respeito pelo esforço?


Outro dia vi Diego Hipólito fazendo um desabafo na tevê depois de sua vitória dupla na etapa de Glasgow da Copa do Mundo. Ele foi medalha de ouro na ginástica de solo e no salto, no entanto, está há oito meses sem receber salário. Qualquer país teria orgulho de seu medalhista e faria de tudo para que ele mantivesse essa posição, mas não os dirigentes da ginástica olímpica brasileira, disse Hipólito. Para que tanto esforço, se não sou reconhecido como atleta? Eu vivo disso, como eles acham que é possível sobreviver sem salário? Foram essas as perguntas que o ginasta deixou no ar, visivelmente contrariado.
A imagem me voltou à mente hoje, ao ler os comentários sobre o grande prêmio de Mônaco da Fórmula Um. A opinião pública brasileira não perdoa os atletas perdedores. É assim com todos os esportes. Diego Hipólito vem sendo desprezado depois que teve um desempenho aquém das expectativas nas Olimpíadas de Pequim. E Rubens Barrichelo, na minha opinião, é um dos desportistas mais injustiçados de todos os tempos. Desde o início da sua carreira, os órgãos de imprensa despejaram sobre ele as frustrações por ele não ter repetido o sucesso de Senna. Ninguém agüentou tanto deboche, e com tanta dignidade, como ele. Até de ‘pé de chinelo’ foi apelidado, tendo virado pesongem caricata nos programas humorísticos da Globo.
Entre os esportes praticados por Hipólito e Barrichelo, há uma distância enorme. No primeiro, o atleta só depende do seu desempenho, enquanto no segundo, além da habilidade do piloto, estão também em jogo os milhões de dólares envolvidos nas marcas, as escolhas das escuderias sobre quem deve vencer, os problemas mecânicos e o rendimento dos carros, as condições meteorológicas, os pneus, a sorte. Barrichelo mudou de marca, conseguiu um carro que rende mais, tem conseguido vitórias,(ainda tímidas, é verdade) e nessa temporada já subiu no pódio cinco vezes. E a imprensa continua ignorando seu esforço, quando não o desqualifica. Dá mais destaque aos iniciantes brasileiros Nelson Piquet e Filipe Massa, enquanto o inglês Jenson Button, companheiro de Rubinho na Brawn e 1º lugar no ranking, é colocado mais alto ainda do que o lugar que ele ocupa no pódio. Acho mesmo que Rubinho dificilmente vai obter reconhecimento. Mas o pessoal da imprensa podia pegar mais leve de vez em quando. Fiquei indignada quando li esta tarde no blog do repórter esportivo Juca Kfuri o post aí de baixo.

Hoje é o Dia da Tartaruga.
E do aniversário de Rubens Barrichelo, que completa 37 anos.
A piada é tão pronta que não custa lembrar: ele chegou em segundo lugar no GP de Mônaco hoje.
Felipe Massa, por exemplo, foi o quarto....

Lamentável! Acelera, Rubinho. E cala a boca dessa gente.

sábado, maio 23

Porque hoje é sábado

Foto roubada na página da PMV
Esta manhã tomei uma decisão corajosa: ir ao centro da cidade fazer pesquisa de preços numa loja bem popular − Casas Bahia. Viram onde a crise faz a gente ir, na esperança de economizar alguns tostões? Como não sabia onde ficava a loja, que é recente no Estado, atravessei toda a avenida Jerônimo Monteiro, fiz o retorno perto da Florentino Avidos e estacionei atrás do relógio da Praça Oito, a poucos passos dela. As surpresas começaram já no início desse trajeto. Acreditem, ao contrário do que supunha, havia um trânsito intenso! Esperava encontrar uns gatos pingados, mas decididamente não fui a única a ter a brilhante idéia de ir ao centro nesta manhã. Só depois me lembrei que, aos sábados, é permitido o estacionamento de veículos ao longo da Jerônimo Monteiro e da Princesa Isabel, daí o congestionamento inesperado. Bem, não encontrei exatamente o que queria, mas, com alguma tranqüilidade, atravessei o camelódromo da Praça Oito e fui dar uma conferida nas novidades da Marisa.

Não pude evitar uma sensação de tristeza enquanto caminhava. Entra prefeito, sai prefeito, e o blablá em torno do projeto de revitalização do centro continua no papel. De boas intenções o inferno anda cheio, diz o ditado. As tímidas intervenções governamentais não foram suficientes para evitar a decadência, e o centro permanece abandonado a sua própria sorte.
Sou do tempo em que as meninas de boa família podiam circular em segurança pelas ruas da cidade, em especial no circuito praça Oito−Costa Pereira, onde todo mundo se encontrava. Minha identidade de capixaba da gema está marcada por muitas idas e vindas pelas ruas da capital. Como moradora do centro, tudo ficava a poucos passos da minha casa: a escola, a catedral, o clube, a sorveteria e a lanchonete da moda, o instituto de línguas, a única livraria, o comércio chique... Peraí, não vou deixar o saudosismo tomar conta deste post.
(Mas que mal há em remexer o baú e tirar dele boas lembranças? )


De volta à realidade, só queria ressaltar o lado bom da minha “aventura” de hoje no centro da cidade. Longe do ambiente asséptico dos shoppings centers, caminhando entre as pessoas que esperavam nos pontos de ônibus, examinavam mercadorias no interior das lojas ou simplesmente iam a algum lugar, me senti um semelhante, me senti povo, como todos. E ao recobrar essa dimensão do humano, em geral apagada no cotidiano, mentalmente me solidarizei com essas criaturas e, por alguns instantes, fui feliz.

sexta-feira, maio 15

Enfim, um movimento bem-humorado

Foto roubada do Terra
Aconteceu hoje no Rio a primeira manifestação promovida pelo movimento dos SEM NAMORADOS. É isso mesmo, uma galera que está cansada de homens que não querem assumir nenhum compromisso (reclamam elas) ou de mulheres interesseiras que só estão de olho na conta bancária (dizem eles) promoveu a passeata. O movimento começou nas conversas da internet e tem como meta conquistar de imediato um parceiro/a para comemorar em grande estilo o Dia dos Namorados no início do mês que vem. Legal, né? Os contestadores, cerca de 200 pessoas, agitaram a Cinelândia, no centro do Rio, e neste domingo um grupo faz reunião semelhante no Ibirapuera, em Sampa. Hummm, achei a idéia de-mais. E estou torcendo pra que uma turminha corajosa comece a agitação também em Vitória. Ou será que por aqui os gatos e gatas disponíveis estão satisfeitos com o comportamento do sexo oposto?

P.S. As adesões ao movimento podem ser feitas na página: www.movimentodossemnamorados.com.br

P.S. 2 : Ah, não esqueçam de me convidar!

quinta-feira, maio 14

Participe da campanha


Que pretensão a minha comparar-me a Sherazade, a contadora de histórias que encantou o sheik. Quem me acompanha já percebeu que não estou escrevendo todo dia, como havia me proposto a fazer. Mas a meu favor cito o fato de que ela, a princesa, estava numa situação limite, na qual, para se safar, ou contava uma história ou contava outra história. Fe-liz-men-te esse não é o meu caso. Minha tentativa tem a ver não com a expectativa da morte, mas com o prazer da escrita e a necessidade de conversar com o mundo. Acontece que nem sempre as coisas caminham como a gente quer. Aliás, acho mesmo que, se a esperta princesa tivesse que exercitar seu processo criativo à frente da tela branca de um computador, talvez fosse traída pela falta de ‘inspiração’ em algum momento. Escrever é bem diferente de verbalizar oralmente narrativas inventadas num registro dramático e persuasivo. Não posso admitir publicamente que escrever não é uma atividade fácil nem automática. Afinal, ganho a vida fazendo meus alunos acreditarem exatamente o contrário. Mas tenho que confessar que escrever diariamente, sem ser profissional da escrita (jornalista, escritor, publicitário), é um exercício de paciência, que requer, primeiro, encontrar o mote, depois as idéias e, por fim, as palavras justas. Simples assim... hahahahah (que meus alunos não me leiam, se não, estou perdida). E para isso tenho que dedicar algum tempo diariamente, coisa que, como todos sabem, está cada dia mais escasso. Sei que é aborrecido seguir um blog e não encontrar um post novo a cada dia. Eu, pelo menos, fico frustrada quando vejo meus blogs favoritos desatualizados. Mas reconheço, humildemente, que não vou dar conta de postar novidades todos os dias. Por isso, paciente leitor, me dê um credito de confiança. Por que você não me sugere algum tema que não quer calar, como fez a Sarah outro dia? Parcerias são sempre bem-vindas. Está aberta a campanha “Ajude a manter este blog atualizado”. Te aguardo.

domingo, maio 10

Sarah, olha aí.

Sempre tive uma certa implicância com esse hábito de festejar a mãe num dia especial. Engrosso a fileira daqueles que defendem a posição de que as mães devem ser reverenciadas todos os dias. Não estou falando de uma pieguice cega, com sabor de obrigação, mas de um sentimento espontâneo de reconhecimento e retribuição ao amor incondicional dessas mulheres, capazes de qualquer sacrifício para que suas crias se tornem pessoas saudáveis, felizes, responsáveis e dotadas de mil outras virtudes que as distingam das criaturas comuns. Sim, porque aos olhos de toda mãe, não há nada mais especial que suas criaturas. E mesmo depois de adulto, por mais que a roda viva carregue esse filho pra lá, ele será sempre lembrado como o ser frágil que ela teve nos braços e que ainda necessita dos seus cuidados para enfrentar a vida. Claro, estou falando da posição de mãe, mas quando somos apenas filhos, não temos essa visão grandiosa do amor materno. A ficha só cai de fato quando mudamos de lado, acho eu. Também já fui filha: filha criança, filha adolescente, filha adulta. Sempre inquieta e rebelde. E também seduzida pelo apelo comercial. A cada segundo domingo de maio, lá ia eu levando o “presentinho”, em geral escolhido em função do que havia conseguido poupar no apertado orçamento doméstico, certa de estar cumprindo meu dever de filha, imaginem. Só muito tempo depois é que entendi que presentes não têm a menor importância. Quero dizer, adoro ganhar presentes quando são escolhidos com carinho, embrulhados com capricho e vontade de agradar. Mas não é bem isso que espero ganhar no dia das mães das minhas filhas. Será que elas já entenderam isso? Ou vou ter que esperar que elas também sejam mães para que isso aconteça?

quinta-feira, maio 7

Um pouco mais de calma

Esta foi uma semana de muita correria. Não bastassem todas as tarefas, ainda andei atrás de apartamento o tempo todo. Olha anúncio no jornal, telefona pra imobiliária, pesquisa os preços, vai lá, pega as chaves, olha o imóvel, sente a sua energia, conversa com o porteiro, investiga se é uma rua tranqüila, volta, devolve as chaves, liga pra outra imobiliária... Ufa! pernas pra que te quero... só quem já passou por essa experiência é que sabe.


Vai daí que comecei a pensar a respeito do que essa cabeça a mil nesse corpo cansado poderia postar esta noite. Ato contínuo, ouvi Lenine cantando daquele jeito doce e, ao mesmo tempo incisivo, uma canção de sua autoria e de Dudu Falcão de que gosto muito e que tem o sugestivo nome de Paciência. Não, não tinha nenhum rádio nem som ligado: ouvi Lenine cantando dentro da minha cabeça, acredita? Direto e reto, sem rodeios. Fechei os olhos e pisei no freio. Obrigada, Lenine. Pra quem não conhece ou não se lembra da letra, reproduzo aí embaixo. Com a recomendação de não perderem a paciência, que às vezes a vida exige um pouco mais de calma. Até a próxima.


Paciência

Mesmo quando tudo pede
Um pouco mais de calma
Até quando o corpo pede
Um pouco mais de alma
A vida não pára...

Enquanto o tempo
Acelera e pede pressa
Eu me recuso faço hora
Vou na valsa
A vida é tão rara...

Enquanto todo mundo
Espera a cura do mal
E a loucura finge
Que isso tudo é normal
Eu finjo ter paciência...

O mundo vai girando
Cada vez mais veloz
A gente espera do mundo
E o mundo espera de nós
Um pouco mais de paciência...

Será que é tempo
Que lhe falta pra perceber?
Será que temos esse tempo
Pra perder?
E quem quer saber?
A vida é tão rara
Tão rara...

Mesmo quando tudo pede
Um pouco mais de calma
Até quando o corpo pede
Um pouco mais de alma
Eu sei, a vida não pára
A vida não pára não...

Será que é tempo
Que lhe falta pra perceber?
Será que temos esse tempo
Pra perder?
E quem quer saber?
A vida é tão rara
Tão rara...

Mesmo quando tudo pede
Um pouco mais de calma
Até quando o corpo pede
Um pouco mais de alma
Eu sei, a vida é tão rara
A vida não pára não...

A vida não pára!...
A vida é tão rara!...

terça-feira, maio 5

Ah, a vida!

Pra não passar em brancas nuvens,
vamos de Clarice Lispector refletindo sobre o imponderável da vida:


Renda-se, como eu me rendi
Mergulhe no que você não conhece como eu mergulhei.
Não se preocupe em entender,
viver ultrapassa qualquer entendimento...

segunda-feira, maio 4

Você trabalha. Confia?

Não é por nada não, mas você confia na palavra do Governo quando ele diz
que o Brasil está preparado para enfrentar a chegada da gripe suína ou
seja lá qual for o apelido que lhe deram? Perguntar não ofende. Conhecemos
os serviços de saúde públicos e temos razões de sobra pra desconfiar.
Façamos um paralelo com a dengue, que entra ano sai ano continua eliminando
centenas de brasileiros pelas sua complicações. Este ano,apenas no
Espírito Santo já foram notificados cerca de 30 mil casos de dengue,
com 35 casos de morte, dos quais 18 confirmados de serem motivados pelas
complicações da doença. Vamos torcer para que a tal da suína fique do lado
de lá da fronteira. Só bravata não basta.

domingo, maio 3

Um pouco de Neruda em italiano




Ode al giorno felice

Questa volta lasciatemi essere felice
A nessuno è successo niente
Accade solamente che sono felice
In tutti i punti del cuore
Mentre cammino, dormo o scrivo.

Sono felice dell’erba nelle praterie,
Sento la pelle come un albero
E l’acqua sotto
E gli uccelli in alto,
Il mare come un anello alla mia cintura
E l’aria canta come una chitarra.

È come se toccassi la pelle azzurra del cielo
E la sua freschezza.

Oggi lasciate che io sia felice,
Felice con l’erba e la sabbia,
Felice con l’aria e la terra
Felice.

(Pablo Neruda)

sábado, maio 2

Porque hoje é sábado

É de Vinicius de Moraes o provocativo poema a seguir.

O dia da criação

I
Hoje é sábado, amanhã é domingo
A vida vem em ondas, como o mar
Os bondes andam em cima dos trilhos
E Nosso Senhor Jesus Cristo morreu na cruz para nos salvar.


Hoje é sábado, amanhã é domingo
Não há nada como o tempo para passar
Foi muita bondade de Nosso Senhor Jesus Cristo
Mas por via das dúvidas livrai-nos meu Deus de todo mal.


Hoje é sábado, amanhã é domingo
Amanhã não gosta de ver ninguém bem
Hoje é que é o dia do presente
O dia é sábado.


Impossível fugir a essa dura realidade
Neste momento todos os bares estão repletos de homens vazios
Todos os namorados estão de mãos entrelaçadas
Todos os maridos estão funcionando regularmente
Todas as mulheres estão atentas
Porque hoje é sábado.


II
Neste momento há um casamento
Porque hoje é sábado
Hoje há um divórcio e um violamento
Porque hoje é sábado
Há um rico que se mata
Porque hoje é sábado
Há um incesto e uma regata
Porque hoje é sábado
Há um espetáculo de gala
Porque hoje é sábado
Há uma mulher que apanha e cala
Porque hoje é sábado
Há um renovar-se de esperanças
Porque hoje é sábado
Há uma profunda discordância
Porque hoje é sábado
Há um sedutor que tomba morto
Porque hoje é sábado
Há um grande espírito-de-porco
Porque hoje é sábado
Há uma mulher que vira homem
Porque hoje é sábado
Há criançinhas que não comem
Porque hoje é sábado
Há um piquenique de políticos
Porque hoje é sábado
Há um grande acréscimo de sífilis
Porque hoje é sábado
Há um ariano e uma mulata
Porque hoje é sábado
Há uma tensão inusitada
Porque hoje é sábado
Há adolescências seminuas
Porque hoje é sábado
Há um vampiro pelas ruas
Porque hoje é sábado
Há um grande aumento no consumo
Porque hoje é sábado
Há um noivo louco de ciúmes
Porque hoje é sábado
Há um garden-party na cadeia
Porque hoje é sábado
Há uma impassível lua cheia
Porque hoje é sábado
Há damas de todas as classes
Porque hoje é sábado
Umas difíceis, outras fáceis
Porque hoje é sábado
Há um beber e um dar sem conta
Porque hoje é sábado
Há uma infeliz que vai de tonta
Porque hoje é sábado
Há um padre passeando à paisana
Porque hoje é sábado
Há um frenesi de dar banana
Porque hoje é sábado
Há a sensação angustiante
Porque hoje é sábado
De uma mulher dentro de um homem
Porque hoje é sábado
Há uma comemoração fantástica
Porque hoje é sábado
Da primeira cirurgia plástica
Porque hoje é sábado
E dando os trâmites por findos
Porque hoje é sábado
Há a perspectiva do domingo
Porque hoje é sábado.

sexta-feira, maio 1

Banana com canela

Então, identificou de cara o objeto ao lado da xícara de café? Será isso mesmo que você está pensando? Se está em dúvida, esclareço: é um abridor de frascos. Talvez você ache estranho, porque abrir frascos, pra você que está em pleno vigor físico, não chega a ser um problema. Mas pergunte a qualquer mulher que já ultrapassou a barreira dos cinco ponto zero se ela é capaz de abrir um vidro de palmitos numa boa. Se ela não for mentirosa, vai admitir que a abertura de frascos que necessitam de uma forcinha a mais para romper o lacre da tampa vai ficando mais difícil à proporção que os anos avançam. Mas basta fixar a tampa com o abridor da foto, girar a embalagem com a outra mão e... pronto, aberta com o mínimo de esforço. Viu só? Pensava nessa maravilha de invenção esta tarde enquanto tentava abrir um frasco novo de canela em pó. Você alguma vez enfrentou esse desafio? Que design mais antigo, né não? Se fosse só feio, tudo bem, mas ainda por cima machuca a mão. Com o abridor tabajara, meus problemas acabaram. Pude comer minha banana da terra frita com canela. Tranqüila, tranqüila.

Ah, ia esquecendo de dizer que a útil ferramenta originalmente foi inventada para quebrar nozes. Mas nozes in natura só aparecem na nossa mesa (quando aparecem) nos dias de Natal. Então dei a ela uma nova utilidade para os outros 364 dias do ano. Ou você acha que algum inventor está preocupado com as dificuldades motoras de uma senhora de mais de 50 (bem mais!) que mora sozinha, hein?